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A Importância Das Fibras Na Síndrome Metabólica

O uso de probióticos, prebióticos e/ou transplantes fecais com finalidade de manipular a microbiota para melhorar a saúde, apresentam grande potencialidade e têm sido cada vez mais usados e estudados.

Introdução:

O trato gastrointestinal humano é composto por uma comunidade microbiana complexa, conhecida como microbiota, com papel central na saúde e impacto no metabolismo, na fisiologia, na nutrição e no sistema imunológico.1,2

Nela temos mais genes do que no genoma humano, aproximadamente 1000 espécies de bactérias, 10 trilhões de microrganismos, predominantes no intestino grosso. Contribuindo para a degradação, fermentação e absorção de nutrientes complexos, como mucinas intestinais, carboidratos e fibras e, para formação do bolo fecal.1–5 Esses nutrientes são transformados em açúcares simples, ácidos graxos de cadeia curta e outros nutrientes mais facilmente absorvidos.4

Além disso, a microbiota participa da produção de vitamina K, B12 e ácido fólico, contribui para o metabolismo da bile e, transforma potenciais agentes carcinogênicos, como aminas heterocíclicas e componentes bioativos, incluindo fitoestrógenos.4

Nos adultos os gêneros predominantes são Bifidobacterium, Lactobacillus, Bacteroides, Clostridium, Escherichia, Streptococcus e Ruminococcus, contudo 60% são do filo Bacteroidetes ou Firmicutes.3,6

Apesar da diversidade da microbiota podemos caracterizá-la em 3 variantes ou enterotipos baseados nos gêneros dominantes: Bacterioides, Prevotella e Rumiococcus.2 Esses enterotipos podem ser influenciados pelos hábitos dietéticos, da seguinte forma: dietas ricas em gordura animal predomina no Bacterioides e as ricas em carboidrato associa-se a Prevotella.2

Alguns estudos mostram uma relação da microbiota com o desenvolvimento do fenótipo da obesidade, ocorrendo um aumento dos Firmicutes e uma redução proporcional das Bacteroidetes nos obesos.6,7 A perda de peso em obesos (Índice de Massa Corpórea (IMC)>30) associa-se a uma inversão dessa relação de Firmicutes e Bacteroidetes.6

A formação da nossa microbiota começa na fase uterina, porém a maior colonização do trato gastrointestinal ocorre ao nascimento, influenciado pelo tipo de parto. Os bebês provenientes de parto normal apresentam uma microbiota associada a um melhor sistema imunológico quando comparado aos de cesárea.2

Da infância ao idoso temos variações na nossa microbiota, influenciadas por dieta, uso de antibióticos, doenças crônicas e pela própria idade, entre outros.2

O desequilíbrio da microbiota gastrointestinal, conhecida como disbiose, pode ser significante na obesidade, desnutrição, diabetes, retocolite ulcerativa e doença de Chron, entre outras doenças.1,7

Além disso, há uma associação com doenças cardiovasculares e síndrome metabólica, uma vez que na dislipidemia relaciona-se com níveis séricos de colesterol, no diabetes com absorção de carboidratos e nível glicêmico e, favorece a obesidade.4

O uso de probióticos, prebióticos e/ou transplantes fecais com finalidade de manipular a microbiota para melhorar a saúde, apresentam grande potencialidade e têm sido cada vez mais usados e estudados.7

Estudos mostram que os hábitos alimentares têm importante papel na constituição e equilíbrio da microbiota, e sua mudança pode alterá-la em 24h, como por exemplo, trocar uma dieta hiperlipídica com pouco teor de fibras por uma hipolipídica com alta concentração de fibras.2 Além disso, o consumo de uma dieta hiperlídica aumenta a concentração sérica de endotoxinas, derivadas da parede de bactérias Gram-negativas, devido aumento da permeabilidade pela modificação da mucosa.5 Essa endotoxemia contribui para a resistência à insulina.5

O papel das fibras na microbiota

A dieta rica em fibras e vegetais inibe alterações da microbiota que levam a produção de substâncias cancerígenas e inflamatórias, como amônia, fenóis, p-cresol, aminas, etc. E, afetam a absorção e degradação dos carboidratos. Por isso, as fibras acabam atuando na redução da inflamação, níveis glicêmicos e na prevenção ao câncer.6

O objetivo das estratégias dietéticas, baseadas nos 3 “P”, probióticos, prebióticos e polifenóis, tem por objetivo modular e equilibrar a atividade metabólica e imunológica da microbiota.6

Destacando os prebióticos, que são substâncias seletivamente fermentadas, levando a mudanças na composição e/ou atividade da microbiata.7 Os prebióticos, como a inulina, conduzem ao aumento de bactérias benéficas como as bifidobactérias e produtoras de butirato, modulando e equilibrando a microbiota.6

Fibras: definições e classificações

As fibras são partes comestíveis de plantas ou análogos de carboidratos, resistentes a digestão e absorção do intestino delgado e, com fermentação completa ou parcial no intestino grosso.8 Incluem várias classes químicas: polissacárides não amiláceos (celulose, hemicelulose, β-glucanos, inulina, gomas naturais e pectina), oligossacárides, lignina, derivados de ácidos graxos, outras substâncias vegetais (mucilagem, fitatos) e análogos de polissacárides.8

Além disso, podemos classificá-las como solúveis (pectinas, gomas e mucilagem) e insolúveis (celulose, hemicelulose, lignina). As fibras solúveis tem maior relação com metabolismo lipídico e glicêmico, prevenção de doença cardiovascular, diferenciação da mucosa ou apoptose e, função de barreira mucosa, devido aumento da viscosidade do conteúdo luminal e da produção de ácidos graxos de cadeia curta.8

As insolúveis, com baixa capacidade de fermentação, atuam mais no bolo fecal, com propriedades de melhora da constipação e da consistência das fezes.8

Recomendação diária das fibras

A recomendação média diária de fibras é de 14g de fibra/1000 kcal, baseando-se em um consumo de 2000kcal/dia para mulheres e 2600kcal/dia para homens, respectivamente, seria 28g de fibra/dia e 36g/dia.9

Para os pacientes diabéticos, a Associação Americana de Diabetes recomenda um consumo de fibra solúvel de 20 a 35 g/dia devido os seus efeitos na redução de colesterol, melhora do controle glicêmico e redução da excreção urinária de glicose. Porém, essa recomendação é muito difícil de atingir apenas na dieta oral, por isso, acabam sugerindo o uso de fibras suplementares.10

Já Associação Dietética Americana recomenda 30-50 g/dia para pacientes diabéticos tipo 2.11

O papel das fibras na obesidade

A obesidade é uma doença crônica, de grande prevalência mundial, associada a várias co-morbidades, como doença cardiovascular, diabetes, hipertensão e dislipidemia.12 Crescendo exponencialmente em todos grupos etários é um dos maiores desafios na saúde pública do século 21.12

As fibras alimentares contribuem na perda de peso por aumento da sensação de saciedade, devido a mudança da viscosidade, formação de gel e de volume do conteúdo gástrico; modulação da função motora gástrica; embotamento da resposta pós-prandial da glicose e insulina; aumento da duração da refeição com maior tempo de mastigação, ativando a saciedade central e periférica; menor consumo calórico por afetar a palatabilidade.8

Além disso, alto consumo de fibras reduz em 30% o risco do ganho de peso ou desenvolvimento de obesidade.9

A ação das fibras na redução dos níveis glicêmicos

O diabetes mellitus é uma doença crescente no mundo todo, aumentado a mortalidade por doença cardiovascular em 2 a 3 vezes mais.9,11

Estudos mostram a atuação das fibras na redução dos níveis glicêmicos e da hemoglobina glicada, e aumento da sensibilidade a insulina nos diabéticos.8,11,13,14 Isso deve-se a redução do esvaziamento gástrico; modificação da atividade mioelétrica gastrointestinal; atraso do trânsito intestinal; redução da difusão de glicose; acessibilidade reduzida da α-amilase aos substratos pelo aumento da viscosidade do conteúdo do trato gastrointestinal.8,13,14

Somado a isso, altos níveis de consumo de fibras estão associados com significante redução no diabetes tipo 2.9,14

A importância das fibras na dislipidemia e hipertensão

Estudos tem mostrado que o consumo diário de fibra solúvel pode reduzir colesterol e triglicérides, porém ainda não demonstraram ação nos níveis séricos de HDL.8,15 Além disso, as fibras induzem a redução do índice glicêmico da alimentação, com efeitos benéficos na dislipidemia.8,15

A ação das fibras na dislipidemia associa-se a aumento da saciedade, inibição da lipogênese hepática e nas incretinas, entre outros.15

As mudanças no estilo de vida com perda de peso, aumento do consumo de fibras e prática regular de exercícios físicos estão relacionadas a redução dos triglicérides e aumento do HDL.16

O aumento do consumo das fibras parece ser uma boa estratégia no controle pressórico e na prevenção da hipertensão. Isso pode ser explicado pela perda de peso, melhora da hiperinsulinemia e da resistência insulínica.8

Conclusão:

A síndrome metabólica caracterizada por obesidade, baixos níveis séricos de HDL, hipertrigliceridemia, hipertensão, hiperglicemia e resistência a insulina apresenta um grande impacto no risco cardiovascular.15

A atuação das fibras na obesidade, hipertensão, dislipidemia e controle glicêmico é fundamental no tratamento dessa síndrome, melhorando o resultado do tratamento medicamentoso oferecido aos pacientes e, com ação comprovada pela comunidade científica.



Dra.Andrea Pereira Médica Nutróloga da Oncologia do Hospital Israelita Albert Einstein Médica Nutróloga da Obesidade e Cirurgia Bariátrica da UNIFESP Instrutora Adjunta da Pennington Biomedical Research Center, LSU


Referências:

1. Guinane, C. M. & Cotter, P. D. Role of the gut microbiota in health and chronic gastrointestinal disease : understanding a hidden metabolic organ. Therap. Adv. Gastroenterol. 6, 295–308 (2013).

2. Clemente, J. C., Ursell, L. K., Parfrey, L. W. & Knight, R. Review The Impact of the Gut Microbiota on Human Health : An Integrative View. Cell 148, 1258–1270 (2012).

3. Conlon, M. A. & Bird, A. R. The impact of diet and lifestyle on gut microbiota and human health. Nutrients 7, 17–44 (2015).

4. Mai, V. & Draganov, P. V. Recent advances and remaining gaps in our knowledge of associations between gut microbiota and human health. Word J Gastroenterol 15, 81–85 (2009).

5. Martel, J., Ojcius, D. M. & Young, J. D. Impact of the Gut Microbiota, Prebiotics, and Probiotics on Human Health and Disease. Biomed J 37, 259–68 (2014).

6. Marchesi, J. R. et al. The gut microbiota and host health : a new clinical frontier. BMJ 1–10 (2015). doi:10.1136/gutjnl-2015-309990

7. Scott, K. P., Antoine, J., Midtvedt, T. & Hemert, S. Van. Manipulating the gut microbiota to maintain health and treat disease. Microb. Ecol. 26, 1–10 (2015).

8. Papathanasopoulos, A. & Camilleri, M. Dietary fiber supplements: effects in obesity and metabolic syndrome and relationship to gastrointestinal functions. Gastroenterology 138, 65–72.e1–2 (2010).

9. Anderson, J. W. et al. Health benefits of dietary fiber. Nutr. Rev. 67, 188–205 (2009).

10. Chandalia, M. et al. Beneficial effects of high dietary fiber intake in patients with type 2 diabetes mellitus. N. Engl. J. Med. 342, 1392–1398 (2000).

11. Post, R. E., Mainous, A. G., King, D. E. & Simpson, K. N. Dietary Fiber for the Treatment of Type 2 Diabetes Mellitus: A Meta-Analysis. J. Am. Board Fam. Med. 25, 16–23 (2012).

12. Pereira, a Z., Marchini, J. S., Carneiro, G., Arasaki, C. H. & Zanella, M. T. Lean and fat mass loss in obese patients before and after Roux-en-Y gastric bypass: a new application for ultrasound technique. Obes. Surg. 22, 597–601 (2012).

13. Meyer, K. a. et al. Carbohydrates, dietary fiber, and incident type 2 diabetes in older women. Am. J. Clin. Nutr. 71, 921–930 (2000).

14. Fujii, H. et al. Impact of dietary fiber intake on glycemic control, cardiovascular risk factors and chronic kidney disease in Japanese patients with type 2 diabetes mellitus: the Fukuoka Diabetes Registry. Nutr. J. 12, 159 (2013).

15. Galisteo, M., Duarte, J. & Zarzuelo, A. Effects of dietary fibers on disturbances clustered in the metabolic syndrome. J. Nutr. Biochem. 19, 71–84 (2008).

16. Singh, A. K., Singh, S. K., Singh, N., Agrawal, N. & Gopal, K. Obesity and dyslipidemia. Int J Biol Med 2, 824–828 (2011).


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